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SEMINÁRIO: Violência sexual e aborto legal são tema de seminário

18/09/2020 às 08:00

Acolhimento no hospital é o foco do trabalho

Estudantes da Faculdade de Medicina (FM), da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), apresentaram seminário sobre violência sexual e aborto, descrevendo um caso real do Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM). O trabalho foca no processo desde a acolhida, as consequências para as vítimas e famílias, esclarece e propõem atenção para alguns pontos.

O aborto é tipificado como crime contra a vida pelo Código Penal de 1940, entretanto, de acordo com o artigo 128 e com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, a mulher tem direito ao aborto se a gravidez é decorrente de um estupro, se representa risco à sua vida ou em caso de anencefalia fetal – quando não há desenvolvimento cerebral do feto.

Em caso de abuso sexual, a vítima tem direito ao atendimento gratuito no Sistema Único de Saúde (SUS), que inclui o recebimento de tratamentos contra doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e apoio psicológico. Se a vítima for mulher tem direito à pílula do dia seguinte, e, em casos de gravidez, ao aborto legal. Entretanto, a idade gestacional deve ser de, no máximo, 22 semanas e o feto pesar até 500 gramas.
Para a realização do procedimento não é necessário a apresentação de um boletim de ocorrência, nem ordem judicial, mas deve haver o nexo causal – vínculo fático que liga o efeito à causa – deve haver a compatibilidade da história da paciente com a do tempo da gravidez. Uma falha no nexo causal se resumiria, por exemplo, à data da última menstruação não bater com a data informada da violência.

No HUJM a recepção às vítimas é feita por uma equipe multidisciplinar ao longo de todo o processo. Composta por médico obstetra, médico pediatra, clinico geral, assistente social, psicólogo, enfermeiros, técnicos de enfermagem, equipe do laboratório, equipe de farmácia, em casos de aborto legal, anestesistas e quando a vítima for uma criança a equipe conta com o acompanhamento de psicopedagoga.

“É um atendimento qualificado que engloba a acolhida, a capacidade de escuta, a garantia do sigilo, o respeito às escolhas. Condutas que precisam ser rotineiramente trabalhadas, então toda a equipe deve estar em consonância para atender da melhor forma possível as pessoa em situação de violência, evitando, de todas as formas, revitimizar essa pessoa, seja ela criança, adolescente, mulher ou homem”, esclarece a pedagoga Valéria Melli, do HUJM.

Esse procedimento é diferenciado da tradicional triagem, sendo o acolhimento a primeira etapa desse atendimento. “Nele são fundamentais a ética profissional, a privacidade, a confidencialidade e o sigilo, garantindo uma atenção humanizada”. Dessa forma a pessoa em situação de violência sexual poderá se sentir acolhido e não julgado, afirma a profissional.

Outro ponto destacado é a necessidade do uso de linguagem apropriada, simples, inteligível, que se aproxime do universo do paciente, estabelecendo uma comunicação efetiva, assim como estar atento à comunicação não verbal, gestos e expressões faciais. “Esse acolhimento é compreender e acreditar no depoimento da pessoa que está falando e nunca, jamais, culpabilizar vítima. Não podemos acelerar ou influenciar nas suas decisões, mantendo a nossa atitude isenta de julgamento, respeitando suas crenças, sistemas de valores e morais”.

Casos em que as vítimas são crianças ou adolescentes, dentro desse contexto de buscar a linguagem apropriada para estabelecer uma relação de confiança, está o uso da ludicidade. “As experiências vivenciadas por uma criança ou adolescente não têm apoio para que ela consiga enfrentar uma abordagem tão rude como é um procedimento abortivo. Então a gente utiliza a ludicidade para trazer esse conforto do passo a passo, da confiança, da afetividade, do apoio, da segurança, a gente traduz o que vai acontecer com uma linguagem que ela possa interpretar”.

Para a profissional é fundamental a melhora na divulgação das informações. “Muitas mulheres sofrem violência sexual e não sabem que podem procurar o atendimento médico no prazo de 72h pra fazer a profilaxia - medidas preventivas para a preservação da saúde”. Dessa forma é possível garantir os cuidados adequados e o acompanhamento necessário.

“A mulher ainda é muito revitimizada nos espaços aonde chega. Sente vergonha e medo de falar, não procura o atendimento e isso tem impacto na saúde física, psíquica e na vida produtiva, dela e dos membros da família, se tornam vulneráveis, inseguras perdendo muito da sua autonomia”, conclui a pedagoga.

Apesar de não ter vivido a experiência de lidar diretamente com a vítima, a estudante do 8° semestre de medicina, Isadora Fernandes Rocha, aponta como foi importante buscar entender como foi o procedimento e como a equipe multidisciplinar trabalhou no caso abordado em seu trabalho.

“É uma área muito triste e angustiante de se trabalhar, visto que em muitos casos as vítimas são crianças abusadas por parentes dentro de casa, por anos. Geralmente muito traumatizadas, demoram pra relatar o abuso, seja porque são ameaçadas pelo abusador ou porque têm medo de ninguém acreditar na sua história. Mas ao mesmo tempo considero muito importante pra minha formação. Acaba sendo um assunto muito abordado na teoria, mas da prática pouco sabemos durante a graduação. Entrar em contato com a história e o prontuário já foi uma experiência bastante intensa.”, aponta a discente.

O aborto legal é um direito das mulheres. Os profissionais de saúde podem declarar objeção de consciência e se recusar a realizar algum procedimento caso isso vá contra seus valores. Entretanto, são obrigados à realizar o procedimento se não houver outro profissional que o faça, ou ainda, se vida da mulher estiver em risco. Isso porque uma instituição médica não pode alegar objeção de consciência e deve garantir esse direito constitucional à essas mulheres.



TAGS:FM HUJM ABORTO CUIABÁ

Fonte: Liz Brunetto Bolsista, com supervisão da Gerência de Imprensa